Ser atendido e tratado com segurança é um direito humano à saúde. Essa foi uma das reflexões feitas por Victor Grabois, presidente da Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do paciente (Sobrasp), no último dia do 52° CBPC/ML, que aconteceu de 25 a 28 de setembro, em Florianópolis. Grabois foi o palestrante do Fórum “O Impacto da Medicina Laboratorial na Segurança do Paciente”, mediado pelo vice-presidente da SBPC/ML, Gustavo Campana. 

O fórum também contou com a participação de Ana Karina Costa, biomédica, coordenadora da Qualidade do Laboratório Lustosa; de Janaína Barrancos, enfermeira, gerente Corporativa de Processos de Enfermagem/Coleta no Grupo Fleury; e de Antônio Capone Neto, médico de Segurança do Paciente do Hospital Israelita Albert Einstein.

Desfechos negativos

Victor Grabois apresentou pesquisas sobre o tema e destacou que o número de desfechos negativos associados aos cuidados do paciente é bastante significativo. Ele afirmou que esse não é um problema novo, mas só recentemente tomou-se consciência da magnitude dele.

Um dos pontos importantes destacados no Fórum é que os Estados devem adotar leis visando à segurança do paciente, pois é dever deles proteger a população dos danos decorrentes aos cuidados em saúde. Política e programas sobre o assunto devem ter como alicerce a Abordagem Baseada nos Direitos Humanos e no referencial do direito humano à saúde.

Grabois relatou que, em duas décadas, alguns avanços na área foram alcançados. Com relação às bases, atualmente há mais traduções e uso de abordagens industriais para a segurança, uma atenção maior à análise de incidentes, à aprendizagem e à retroalimentação. Sobre a definição do dano sob o ponto de vista profissional, a segurança do paciente ainda está relacionada a uma perspectiva médico-legal. Porém, há uma maior compreensão do erro humano e das influências organizacionais. No perímetro de inclusão há um reconhecimento da importância dos fatores humanos e das ciências humanas. Além disso, os fatores organizacionais e cultura de segurança são prioridades adicionais no cuidado.

Trabalho multiprofissional

Para o presidente da Sobrasp esses avanços são significativos, mas ainda é necessário o entendimento de que existe um conjunto de fatores para se chegar a uma melhor segurança do paciente. Um deles é compreender que tornar o cuidado do paciente mais seguro não se limita apenas a uma categoria, seguimento, profissionais, gestores, hospitais ou o próprio paciente. É um trabalho em conjunto, multiprofissional.

Ele enfatizou ainda que é preciso criar um processo padronizado para se atingir a qualidade na segurança em saúde. Para isso, Victor Grabois destacou alguns elementos estruturantes que podem levar a dano zero para pacientes, familiares e profissionais. São eles: visão; verdade, respeito e inclusão; desenvolvimento de liderança; e expectativas de comportamentos.

Para o médico, o novo desafio é criar um modelo mais abrangente que aborda: a mudança do papel do hospital (de um local de permanência para um ponto de atenção no fluxo do paciente); a relevância dos atores de acordo com o ponto de atenção (como home care com o paciente e o cuidador como protagonistas); e a importância dos perigos com o ponto de atenção (peso do erro diagnóstico e da percepção do dano na atenção primária).

Outras estratégias para engajar pacientes e familiares na questão também foram abordadas durante a palestra, como: a criação de comitês consultivos de pacientes e familiares, shadowing pacientes e familiares, enquetes e rondas das lideranças com foco na segurança do paciente.

Comunicação

Segundo Gustavo Campana, o debate sobre a segurança do paciente leva a um nível de discussão mais amplo e abrangente. “Em laboratório falamos muito de erro, nível de serviço, mas não possuímos uma literatura que dê suporte aos desfechos dos exames laboratoriais. Estudos mostram que quase 70% das decisões clínicas passam por informações laboratoriais. O número de dados que a medicina diagnóstica gera é realmente muito grande e com as novas tecnologias, saindo de uma avaliação transversal e indo para uma avaliação de risco, talvez seja possível chegarmos a previsões e detectar oportunidades previamente.”

Para Janaína Barrancos, do Grupo Fleury, a padronização do processo e a comunicação são alguns dos desafios da questão e que podem ajudar a desmitificar alguns conceitos. “O profissional de saúde, de uma forma geral, não está preparado para falar do erro. Ele não é treinado para discutir isso. O erro é visto como uma negligência e a primeira atitude é encontrar um culpado. Fazer com que os profissionais entendam que ele não será apontado pelo erro, e, sim, terá ajuda para resolver a questão e não voltar a cometer o mesmo equívoco, é só mais um desafio.”

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Ana Karina Costa explicou que no Laboratório Lustosa esses dois tópicos (padronização e comunicação) também têm atenção especial. “É importante que todos falem a mesma língua e executem as atividades da mesma forma. No nosso laboratório temos muitas unidades separadas, o que dificulta uma padronização. Além disso, é preciso pensar em uma definição e posicionamento estratégicos da empresa e incentivar o engajamento dos colaboradores.”

Representando o Hospital Albert Einstein, Antônio Capone destacou que na instituição é realizado treinamento para capacitar os profissionais de qualquer área do hospital em favor da segurança do paciente, mas só essa atitude não basta. “A capacitação é importante, mas a ação ainda assim é fraca. É importante que se tenha um processo e atendimento padronizados, e uma boa comunicação entre as partes. Além disso, outro ponto importante é ter uma liderança visível para ajudar o profissional a trabalhar com erro.”

Veja fotos do Flickr do 52º CBPC/ML em flickr.com/sbpcml.

Texto: Patrícia Bernardo/DC Press